Exposición en Lisboa, Portugal

Before breakfast

Dónde:
Cristina Guerra Contemporary Art / Rua Santo António à Estrela, 33 / Lisboa, Portugal
Cuándo:
24 may de 2023 - 01 jul de 2023
Inauguración:
24 may de 2023 / 22:00
Precio:
Entrada gratuita
Artistas participantes:
Enlaces oficiales:
Web 
Descripción de la Exposición
«(...) Vou começar por baixo, que são os elementos, a materialidade (...) que seria a zona verde, o elementar, o físico. Um degrau acima disso é o que eu chamo o mundo real. É a rua, a casa — é quando não estamos a pensar em nada (...). (...) o mundo seguinte é o mundo emoldurado; as artes, o teatro, a imagem, (...). Isso está no centro. Acima disso, temos a linguagem, o signo. E isso seria a preto e branco. Então o fundo é verde, o mundo é azul, o mundo emoldurado é amarelo. E agora estamos a preto e branco, que é o signo. E no topo está o vermelho, o sujeito. E o sujeito tem realmente que ver com o sentimento do signo. É a relação com esse signo. Por isso, de certa forma, o vermelho é o significado, o significado sem fisicalidade. (...) Portanto, num extremo está ... o sujeito sem materiais e no outro extremo está o objeto sem sujeito. Esses são os bibliocantos, e estão presentes no meu trabalho desde os anos setenta.»1 No início dos anos 1970, quando estava na Cal Arts em Los Angeles, Matt Mullican começou a investigar os diferentes tipos de relações que a sua «pessoa», com as suas faculdades mentais, os seus sentidos, o seu corpo e o seu conhecimento, podia estabelecer com uma imagem, com as imagens em geral. Mullican queria «entrar» nesse espaço oferecido por qualquer representação da realidade com a qual nos relacionamos habitualmente a partir de uma perspetiva performativa e criativa. Tanto a linguagem como a fotografia tinham passado a fazer parte dos materiais com que se produzia arte após várias décadas de autêntico «big bang», durante as quais a explosão do sistema das belas-artes deu lugar ao que hoje conhecemos como «arte contemporânea». Descendente direto das vanguardas, Mullican quis explorar novos espaços, materiais e procedimentos para produzir a sua obra numa altura em que todas as invenções possíveis pareciam ter sido feitas. E esses espaços surgiram num território intermédio entre o mundo material e o mundo imaginado. Gradualmente, a interação desse mundo real com o mundo representado deu origem a uma cosmologia, a um discurso visual que o organizou e lhe deu sentido. Nesse novo cosmos, com algumas semelhanças com o espaço descrito pela geometria euclidiana e regido pela teoria da gravidade, vivia Glen, uma personagem fictícia dotada de uma atividade paralela à do artista. No seu atelier, Glen trabalhava, descansava, pensava e agia nas margens da corporeidade bidimensional e anotada do desenho. Glen não é exatamente Mullican, mas uma representação do artista em estado de hipnose. O desejo de «entrar» no interior das imagens levou o artista a experimentar várias vezes, através de performances, a criatividade sob a ação e o controlo de um hipnotizador. Neste estado, há uma certa — embora indescritível em termos científicos — alteração da consciência através da qual emerge o subconsciente da pessoa hipnotizada. «Glen é totalmente separado do indivíduo em que eu me transformo sob hipnose. Tenho uma série de teorias sobre quem é essa pessoa, mas diremos apenas que é assim que eu sou quando estou num estado de transe». O mundo dos signos e a realidade paralela em que se movem a consciência do artista e a personagem Glen deram origem a numerosas tentativas de representar a ligação íntima e a interdependência entre a subjetividade produtiva e aquilo que tomamos por factos reais, objetivamente demonstráveis. Entre estes dois polos organizam-se todas as outras coisas que existem. Por isso, o artista decidiu organizar tudo em torno de uma cosmologia própria que dá sentido à obra e serve de gramática para o desenvolvimento aparentemente infinito de uma produção que circula em inúmeras direções. A perceção, o funcionamento dos sentidos e o que a consciência faz com as sensações físicas é um dos pilares sobre os quais Mullican constrói sua obra. A ciência e as teorias do conhecimento que sustentam o método científico dizem-nos que conhecer é uma relação entre um sujeito que percebe e um objeto que é percebido e conscientemente estudado. Os sentidos dão-nos informação sobre o mundo exterior, mas o exercício da razão deve impedir-nos de cair na armadilha das ilusões momentâneas — os sentidos podem enganar-nos — e garantir a veracidade dos nossos juízos. Para Mullican, a luz é o principal elemento que torna possível o encontro entre o sujeito e os objetos que lhe são exteriores: «Ainda tenho a ideia de que tudo o que vejo são padrões de luz. Portanto, quando estou a olhar para alguém ou para alguma coisa (...) é tudo luz. Eu estou desligado. E isso inclui uma aparição e (...) tudo, desde quando acordo de manhã, até quando tomo o pequeno-almoço, até quando estou a andar na rua; quando me cruzo com quem quer que seja; quando estou a falar convosco; quando estou a atuar». As cores, de facto, podem ser apenas variações na forma como a luz é refletida pela superfície dos objetos: as cores em si podem não existir. A obra de Mullican tem sido apresentada através de uma grande variedade de técnicas e materiais, incluindo pintura, desenho, aguarelas, frottage, diferentes métodos de reprodução gráfica, manual, mecânica ou química, fotografia, escultura, instalações, performances, utilizando praticamente todos os materiais ao seu alcance, do mais tradicional ao mais inovador, do mais rude e inesperado ao mais delicado. São inúmeras as categorias e modos de produção que tem vindo a investigar, a combinar e a alternar ao longo da sua carreira. Recorde-se que Mullican foi, no início dos anos 1990, um dos pioneiros na experimentação da realidade virtual, ou seja, antes de esta tecnologia ser uma realidade. Em 1991, eu estava entre o pequeno grupo de pessoas que assistiu à apresentação de Five into One (uma das primeiras encomendas públicas de uma obra que utilizava a realidade virtual) em Tourcoing e recordo-me da forte impressão causada pelo dimensão espetacular do hardware necessário para alojar aquela obra interativa: uma torre, um edifício composto por vários discos rígidos interligados. Mullican tinha realizado (virtualmente) o seu desejo de «entrar» nas imagens e de tornar essa experiência parte da sua obra. BEFORE BREAKFAST. A EXPOSIÇÃO EM LISBOA. O título da exposição não a resume ou ilustra: define as coordenadas temporais de um momento crucial em cada dia da vida. O pequeno-almoço pontua o início simbólico e fisiológico das tarefas diárias, para aqueles que levam uma vida solar. Para os americanos, o pequeno-almoço é a refeição mais importante do dia e os alimentos que nele se consomem podem até ser pesados em consistência. Uma série de dezasseis fotografias mostra-nos o que os olhos do artista veem todos os dias antes do pequeno-almoço, ou seja, desde o acordar, momento em que saímos do mundo do sono e dos sonhos que sonhamos, passando por todas as atividades que transferem para o mundo material, para a consciência, para a gravidade e para o espaço euclidiano. Antes do pequeno-almoço é uma transição simbólica e funcional entre mundos, entre estados de consciência, para a vigília e a longa viagem de tudo o que fazemos «durante o dia». Mas o título da exposição também situa esta apresentação entre duas performances recentes: Em Waking Up, o artista estava sob efeito de hipnose e teve lugar a 15 de Outubro de 2022, em Lübeck, por ocasião da exposição relativa ao prémio Possehl Preis, que o artista recebeu nesse ano. A segunda performance, Breakfast, teve lugar em Nova Iorque, a 1 de Abril deste ano, no contexto da sua exposição na Peter Freeman Gallery. A presente exposição tem, pois, um enquadramento simbólico, mas sobretudo dramatúrgico, na representação do que poderia explicar o sentido da vida na rotina ou nos atos pseudomecânicos que a atravessam. A exposição a que hoje assistimos na Galeria Cristina Guerra não contém elementos tecnológicos evidentes ou a expressão de uma intenção enciclopedista ou científica. Trata-se de uma exposição de «gabinete», um ensaio onde o passado recente da sua produção se relaciona com trabalhos que aqui são apresentados pela primeira vez. Nesta seleção de obras é de notar os contrastes entre escalas e materiais. Em primeiro lugar, temos Untitled (2019), uma faixa semelhante às que figuraram em algumas das mais impressionantes exposições do artista durante a década de 1990. Com cores planas e uma combinação de formas geométricas básicas, estas obras, que normalmente flutuam nos tetos ou pendem do alto das paredes, reproduzem em espaços interiores sinais e dimensões típicos de ambientes monumentais. A simbologia das bandeiras e a proporção dos grandes espaços públicos fazem-nos pensar em reuniões, cerimónias, manifestações ou competições desportivas com muita gente. Mullican despojou-as do seu significado ideológico ou comercial para as remeter para a sua pura materialidade gestual. A obra é apresentada numa configuração curiosa, metade pendurada na parede, metade estendida no chão, como se estivesse «sentada» e encostada à parede. A simplicidade volumétrica da tela complica-se quando ela se torna num plinto virtual, uma escultura tridimensional que já não funciona apenas como um signo e cria o seu próprio espaço arquitetónico. Como vimos na citação com que se inicia este texto, talvez seja bom recordar que, nos seus mapas e cartografias cosmogónicas, Mullican associa determinadas cores a «regiões» específicas nelas representadas. Assim, o verde representa as coisas essenciais, o vermelho está associado aos valores espirituais, o amarelo às manifestações da consciência, o azul aos atos inconscientes e o preto ao mundo da comunicação e da linguagem. De volta ao mundo da intersubjetividade, o vermelho e o preto têm, em conjunto, significados historicamente determinados. E uma bandeira com um círculo vazio no centro pode também fazer-nos pensar numa mudança súbita de regime após uma revolução, uma autometamorfose política que exige o desaparecimento dos velhos emblemas enquanto se espera a criação de novos. Mas não estamos no mundo da intersubjetividade, mas sim naquele que é próprio do artista. Nas representações cosmológicas de Mullican, as cores vermelha e preta simbolizam o encontro do sujeito e do signo. Cinco painéis de ferro, uma obra anteriormente exposta num espaço público, representam os cinco mundos da cosmologia de Mullican. Database (2020) tem a aparência de um modelo, ou do esqueleto de uma construção gótica, se pensarmos nas formas estilizadas e na sua altura proporcional à base. A metáfora entre a organização de dados em ambientes digitais, aquilo a que hoje chamamos «a nuvem» e a arquitetura — ou o urbanismo — é já clássica, sobretudo na obra de Mullican, onde o digital, imaterial, etéreo e aparentemente omnipresente, está permanentemente em diálogo com materiais, técnicas e formas construtivas aparentemente arcaicas ou, pelo menos, pertencentes ao mundo pré-moderno (pirâmides, cúpulas, arcos,...). Objeto, escultura ou maquete, Database é acompanhada por uma obra em realidade aumentada apresentada num tablet móvel, que lhe está adjacente, com o qual o espectador pode navegar no interior da estrutura representada na maquete enquanto circula no espaço real da galeria e da exposição. Os conceitos pré-modernos, modernos e pós-modernos foram e são submetidos a uma enorme pressão semântica, pressão-tensão que traduz a nossa própria impaciência em saber qualificar o nosso tempo, o nosso presente, o que temos para partilhar com os outros. De facto, quão longe está a «nuvem» digital da «arquitetura de dados» que usávamos como metáfora até há bem pouco tempo. Gostaria de concluir com uma reflexão ligada a um grande conjunto de aguarelas sobre madeira que, embora de dimensões modestas, dominam o ambiente da exposição. Sempre imaginei a madeira como um poço sem fundo para a humidade que dá vida à aguarela. Por mais cor que se aplicasse na superfície, temia nunca vir surgir a imagem, que seria infinita e permanentemente absorvida pelo material. Mas uma vez que vi as obras na casa-arquivo-estúdio do artista, a minha preocupação desapareceu: uma aguarela sobre madeira é muito semelhante a uma aguarela sobre cartão ou sobre papel. A textura rugosa do suporte pode ser apreciada, o que confere à imagem uma certa aspereza, sem nitidez. As formas e as cores parecem esbater-se nas sombras e as cores mudam. São obras onde a relação entre fundo e figura é rejeitada; nelas vemos paisagens, terrestres ou galácticas, com uma área central ocupada na maioria dos casos pelo motivo do círculo. O alvo, o planeta terra, o sol, as estrelas..., são formas associadas, mais uma vez, a signos e símbolos antigos e modernos, códigos passados ou futuros. A maior parte destes trabalhos são executados a preto e branco e nos tons intermédios entre eles. Muito poucos contêm cor, como se a luz que inicialmente deslumbrou o artista, e que deveria permitir-nos ver e ver cores ao mesmo tempo, se tivesse tornado monótona ou seca. Matt Mullican escolheu como sinal da exposição uma das poucas aguarelas sobre madeira com cor. É azul e representa o mundo e os seus elementos materiais. Nela, vemos o que parece ser um planeta terra transformado em planeta mar, porque não se vê nenhuma terra seca, nenhum continente ou ilha, nenhuma superfície sólida. Tudo é líquido, tudo é azul. Tudo é água depois do derretimento das calotas polares e das inundações sem fim por todo o lado: já vivemos submersos nela como peixes. Como o artista nos disse... «o mundo é azul». Bartomeu Marí Maio de 2023 ------------------------ 1 Todas as citações neste texto foram retiradas da entrevista «Matt Mullican with Dan Cameron». In The Brooklyn Rail, New York, Abril 2023, pp. 21-27

 

 

Entrada actualizada el el 09 jun de 2023

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