Encontro de afetos

Quando dois ou mais artistas plásticos apresentam numa galeria de arte alguns dos seus trabalhos, nem sempre as afinidades de perspectiva se reúnem, não existe um propósito de condicionar as escolhas, no entanto a afectividade pode ser motivo, e é motivo se a exposição reduz-se a dois artistas. Por isso também aceitei sem hesitação o desafio que a Fátima Luz me fez para participar numa exposição com o Dario Alves. Reflectindo depois sobre a hipótese de haver alguma aproximação entre o meu trabalho e o do Dario Alves, ressalvadas as diferenças, concluo que a imaginação simbólica nos aproxima. Em Dario Alves a imaginação simbólica assume-se através da figura humana, a mulher, para acentuar o seu erotismo, atravessado por um sentido humorístico e a ironia e não são indiferentes os títulos dos quadros, as palavras. A imaginação simbólica do meu trabalho ... segue um caminho diferente, vai buscar a figuração à representação visual da escrita e convoca outras situações, mas também as palavras, mesmo se elas não estão presentes.

Em regra a palavra pintada se generaliza, se bem que a compreensão possa escapar ao entendimento, não apenas dos artistas, mas daqueles que acompanham o trabalho deles. É preciso acrescentar que a arte afastada dos fazeres artesanais processa uma intenção significada, às vezes relacionada com a vida, as obras são pensadas, não surgem por acaso, e relevam o sentido de um conhecimento, entre o fazer e o ser.

Emerenciano

2012-10-03

Em poucas palavras, nesta exposição, vão estar frente-a-frente dois Pintores quase da mesma geração, Dario Alves e Emerenciano.

Este frente-a-frente não significa nenhuma rivalidade ou animosidade. Bem pelo contrário, somos amigos de há muito tempo.

Significa, sim, que vamos partilhar o mesmo espaço com atitudes e configurações diferentes, com estéticas e raciocínios diferentes, mas que, no entanto e neste caso, acabam por se poderem, sem grande esforço, complementar.

Ambos usamos a palavra ou o texto nas nossas tão diferentes formas de expressão. No entanto em Emerenciano, esses sinais, ainda que não legíveis representam a textura, o texto. São por assim dizer, o corpo da sua Pintura. São o corpo e são também o espírito, o saber e o estudo, porque é disso que vivem e se apresentam na sua grandiosidade mesmo quando de pequenas dimensões. Já as minhas figurações usam a palavra ou o texto na forma de títulos, provavelmente significantes, (como que para encerrar a imagem dentro de algumas veleidades interpretativas), mas noutras vezes, distantes daquilo que é representado, agora com ironia, chegando mesmo a uma aproximação do absurdo ou da incongruência.

É que, para mim, a Pintura, em geral, segue muitos caminhos, formas, expressões e execuções diferentes e acaba 'muito para além de tudo' por reflectir essencialmente a forma como cada autor encara a realidade e a contemporaneidade em que vive: com mais ou menos esperança, mais ou menos angústia, mais ou menos desespero, compreensão, raiva, alegria, ou sei lá que mais.

E até humor, que é talvez mais o meu caso, como me dizem as pessoas que se identificam com aquilo que faço: fazendo com uma técnica demorada (algumas vezes) e 'piscando o olho', com amizade, aqui ou ali...'

Dario

Outubro 2012