Cada prática curatorial apresenta seus próprios desafios e o propósito de realizar este trabalho de criação em formato colaborativo/compartilhado agrega um grau de complexidade aos termos do projeto. Exposições que reúnem diferentes artistas, por sua vez, colocam um problema específico ao exercício da curadoria. No caso, o de preservar o significado individual da obra em confronto com a rede de sentidos gerada pela relação com os demais trabalhos integrantes da exposição. Esta trama de sentidos, construída pela escolha por uma determinada disposição no espaço, é um aspecto central daquilo que entendemos por curadoria. Seguindo esta linha de pensamento, toda curadoria pode ser compreendida como compartilhamento de experiências, como um exercício de “fazer juntos”.
Partindo do conjunto constituído pelos artistas representados pela Galeria Mamute, buscamos inicialmente olhar cada obra em particular, considerando as possíveis proximidades e diferenças entre pesquisas artísticas específicas em suas proposições conceituais, linguagens e técnicas. Assumimos que o critério...norteador/gerador desta curadoria seria resultado deste contato/experiência com as obras. Em meio ao processo, o título da exposição delineou-se a partirdo cruzamento entre os posicionamentos assumidos pelos integrantes do Laboratório de Curadoria em relação aos pontos de conexão - conceituais, poéticos, formais – estabelecidos entre as obras que configuram a mostra. Ensaio sobre o Visível, título que em um primeiro momento remete ao clássico de Saramago, Ensaio sobre a Cegueira, leitura tão oportuna nos dias em que vivemos. Uma narrativa sem ponto final.
Entretanto, Cidades Invisíveis, de Calvino, com seus labirintos, indeterminações, associações cruzadas, nos parece muito mais próxima desta experiência curatorial que se constrói efetivamente e se revela na montagem, ao percorrer das salas da Galeria Mamute, localizada em um antigo prédio no centro de Porto Alegre. Cada obra foi escolhida por suas especificidades poéticas, conceituais e formais, mas temos em conta – e este é efetivamente, o propósito da montagem curatorial – que as relações de vizinhanças produzem efeitos, fazem emergir determinados aspectos, mais ou menos sutis, convocam um “ver como” ao pousar o olhar sobre as imagens. Este “ver como”, porém, é um exercício a ser realizado na relação do espectador com a exposição, ao percorrer os espaços na direção e no ritmo que melhor lhe convier. Em alguns casos, nitidez e precisão. Em outros, a sombra, a fluidez, a dúvida. Transparência ou opacidade. Uma paisagem, um gesto, uma cena. Alguma perturbação na ordem aparente das coisas.
Como advoga Jacques Rancière, o olho não precisa saber de antemão o que está vendo, para que a experiência do ver seja efetiva em sua potência para o pensamento ou para a ação. Ensaio sobre o Visível é consequência de um exercício de curadoria em modo colaborativo/compartilhado proposto e realizado durante a disciplina de Laboratório de Curadoria, oferecida pelo curso de bacharelado em História da Arte do Instituto de Artes da UFRGS e integrada também por estudantes do Bacharelado em Museologia. Ao longo do segundo semestre de 2015, o grupo formado por 14 acadêmicos acompanhou e desenvolveu as diversas etapas do laboratório de curadoria, elaborando três propostas alternativas, a partir das quais a montagem definitiva de Ensaio sobre o Visível foi configurada. Integraram o grupo de acadêmicos, em ordem alfabética: Andrei Moura, Carina Kaiser, Caroline Grasel Oliveira, Diego Beck, Dóris Couto, Érlon de Olivera, Evelyn G. Lima (Artes Visuais, monitoria acadêmica), Gisela Teixeira de Aguiar, Liana Schedler, Lucia Marques , Maria Ricken de Medeiros, Monise Kindermann, Patrícia Gabriela, Pedro Cupertino e RossanaKlippel.
Ana Albani de Carvalho
Entrada actualizada el el 05 abr de 2016
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